Depois de um dia maravilhoso, como um sábado no Ibirapuera com meu filho Wellington, eu vou para a cama, agradeço a Deus e durmo com um retrato mental daquelas horas, o calor ainda na minha pele. Mas acho que, com o pequeno menino, o que acontece é diferente. Trabalho diariamente no apartamento de sua mãe e ele sempre me pareceu um garoto normal. Ri quando se deve rir e chora quando se deve chorar. Pede doce e brinca de criar infernos quando o recusam. É bonito, rechonchudo, vulnerável. Mas acho que com ele é diferente o poder de adorar o que se acabou de viver. Naquele dia, fim da tarde, eu só esperava que voltassem do passeio, ele e a mãe, para poder descer ao ponto de ônibus. Quando entraram, vi que ele voou através da sala num grande estado de estímulo. A patroa comentou comigo: — Acho que ele nunca se divertiu tanto. Dava graça de ver o menino ofegante: — Vou escrever no caderno, mamãe. Vou escrever no caderno tudo o que aconteceu. Esquentei a comida para eles, um
O velhinho ia adorar aquela peça. Eu até já podia ver um sorriso escapando do seu recato meio acaipirado. Eu havia procurado bastante, mas foi numa hora inesperada que o disco apareceu. O bar barulhento inaugurado meses antes bem diante de minha porta trouxera ao meu comércio um novo público. A circulação aumentou, estendi o horário em quase todos os dias e foi numa sexta quase meia-noite que um guri calado chegou com quatro discos velhos e aceitou minha primeira oferta. A joia do negócio foi uma bolacha inacreditável de 45 rpm, trilha sonora de Love letters, filme de ainda antes dos bons tempos, com música de Victor Young. O velhinho ia adorar, sem dúvida. “Love letters”, a canção principal, nunca havia faltado no estoque, várias versões para cada década decorrida, menos ou mais meladas, menos ou mais espremidas ou esticadas, com voz, sem voz, nostálgicas, amodernadas. Mas ele desejava a primitiva e repelia as genéricas. Logo na segunda depois do almoço ele entrou pel