Eu quase não percebi aquele personagem diminuto. Era apenas um homem qualquer, sentado ao lado de uma moça no banco de espera do restaurante. Conversavam distraidamente quando entrei, faminto, procurando com urgência a anfitriã.
Mas ela não estava no balcão do vestíbulo. Conheço bem a casa. Passei ao salão das mesas e ela me viu, voltando de acomodar três jovens lá no fundo:
— Só um lugar hoje — expliquei.
Aguardei de pé, ao lado do homem que falava continuamente com sua companhia. Éramos apenas nós três. Cinco minutos se passaram sem aparecer mais ninguém.
A anfitriã enfim me chamou. Eu me movi para segui-la, mas o homem se interpôs abruptamente:
— Nós chegamos antes.
Percebi a consternação no olhar da funcionária, que deu uma espiada na sua ficha e perguntou o nome dele.
Ele não havia se inscrito.
— Mas o senhor sabe que nós chegamos antes — ele argumentou.
Quase abri mão do privilégio, mas o estômago reforçou o seu sinal e eu respondi ao homem apenas com um gesto, apontando para a caderneta como quem pede respeito à legalidade e sua importante função. Ele não insistiu. Deu um exagerado suspiro de desalento e fracasso, abrindo passagem para mim.
Quando eu estava entrando no salão, porém, detive-me ao ouvir sua pergunta:
— O senhor é feliz?
Voltei-me para ele e arregalei os olhos diante desta pergunta sempre aberta e, a cada vez, completamente absurda. Requer muita engenharia filosófica e dispensa leviandade. Mas ele não me deu tempo nem de absorver a questão que tinha feito:
— Porque eu sou feliz. Eu sou. Você pode se achar feliz com essa competitividade mesquinha. Mas está estrangulado dentro da gravata, sozinho na noite de sábado, crendo que possui um automóvel de belo porte e que é livre para subjugar todas as pessoas com o primeiro poder que lhe cai nas mãos. Saiba que eu sou o verdadeiro feliz, dono do meu tempo, casado há anos com uma mulher bela, tranquila e também feliz, sem me sujeitar a arbitrariedades, com saúde, sem neuroses e sem pílulas. Fique com essa satisfação rasteira. O que eu tenho, você nunca terá.
Não há réplica para tal lição. Minha fome tinha aumentado, então aceitei o sermão depressa e quase lhe estendi o braço, como se fosse me despedir de um amigo.
Ele tinha adivinhado praticamente tudo. Mas gosto de gravatas — e não uso comprimidos. Tenho neuroses? Outra pergunta difícil. Sei que a existência é dura, e mesmo assim vou vivendo com certa paz.
Não demorou para ele receber sua mesa. A esposa um pouco atarantada movia-se sorridente atrás dele. Sentaram-se ao alcance da minha vista e fui forçado a observá-los.
Trocaram poucas palavras e avançaram na comida assim que os pratos chegaram. O homem mais feliz do mundo jantava com uma expressão sombria.
Mas ela não estava no balcão do vestíbulo. Conheço bem a casa. Passei ao salão das mesas e ela me viu, voltando de acomodar três jovens lá no fundo:
— Só um lugar hoje — expliquei.
Aguardei de pé, ao lado do homem que falava continuamente com sua companhia. Éramos apenas nós três. Cinco minutos se passaram sem aparecer mais ninguém.
A anfitriã enfim me chamou. Eu me movi para segui-la, mas o homem se interpôs abruptamente:
— Nós chegamos antes.
Percebi a consternação no olhar da funcionária, que deu uma espiada na sua ficha e perguntou o nome dele.
Ele não havia se inscrito.
— Mas o senhor sabe que nós chegamos antes — ele argumentou.
Quase abri mão do privilégio, mas o estômago reforçou o seu sinal e eu respondi ao homem apenas com um gesto, apontando para a caderneta como quem pede respeito à legalidade e sua importante função. Ele não insistiu. Deu um exagerado suspiro de desalento e fracasso, abrindo passagem para mim.
Quando eu estava entrando no salão, porém, detive-me ao ouvir sua pergunta:
— O senhor é feliz?
Voltei-me para ele e arregalei os olhos diante desta pergunta sempre aberta e, a cada vez, completamente absurda. Requer muita engenharia filosófica e dispensa leviandade. Mas ele não me deu tempo nem de absorver a questão que tinha feito:
— Porque eu sou feliz. Eu sou. Você pode se achar feliz com essa competitividade mesquinha. Mas está estrangulado dentro da gravata, sozinho na noite de sábado, crendo que possui um automóvel de belo porte e que é livre para subjugar todas as pessoas com o primeiro poder que lhe cai nas mãos. Saiba que eu sou o verdadeiro feliz, dono do meu tempo, casado há anos com uma mulher bela, tranquila e também feliz, sem me sujeitar a arbitrariedades, com saúde, sem neuroses e sem pílulas. Fique com essa satisfação rasteira. O que eu tenho, você nunca terá.
Não há réplica para tal lição. Minha fome tinha aumentado, então aceitei o sermão depressa e quase lhe estendi o braço, como se fosse me despedir de um amigo.
Ele tinha adivinhado praticamente tudo. Mas gosto de gravatas — e não uso comprimidos. Tenho neuroses? Outra pergunta difícil. Sei que a existência é dura, e mesmo assim vou vivendo com certa paz.
Não demorou para ele receber sua mesa. A esposa um pouco atarantada movia-se sorridente atrás dele. Sentaram-se ao alcance da minha vista e fui forçado a observá-los.
Trocaram poucas palavras e avançaram na comida assim que os pratos chegaram. O homem mais feliz do mundo jantava com uma expressão sombria.
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