Algumas meninas arrancam os saltos para pisar já no chão fofo do elevador. Eu prefiro suportar a dor mais dois minutos, manter o porte e desabar somente no sofá da sala.
Naquela noite, mesmo com essa pressa, segurei a porta para um homem do quinto, em quem nunca tinha prestado atenção.
Ele não me agradeceu, ou despercebi. Encarou depressa, mas perceptivelmente, o decote que eu não havia tido tempo de trocar na saída do evento.
Cada um apertou um botão. Foi então que ele disse:
— Quanto é o programa, querida?
Não sei de que modo externei o sufoco em meu coração ao ouvir essas palavras. Posso ter gemido, ou suspirado. Ele não me amedrontava. A pergunta teve até leveza, descuido. Não consegui dizer nada, ou não quis. Farejei por bafo de álcool, mas o resultado foi inconclusivo. Saí no meu andar sem lhe voltar o rosto.
Já recebi propostas em eventos, mas sempre soaram diferente para mim. A pessoa é comedida, muitas vezes não avançando além da sugestão indireta. Isso me permite negar com educação e pelo menos fingir que não sofri nenhum embaraço. Se um desconhecido me convida para jantar, o que parece até honrado, recuso para não estimular confusões.
No elevador, porém, foi um assalto. O prédio é meu lar, meu aconchego. No trabalho posso estar vendendo minha beleza e juventude para uma marca. Certamente excito. O que fazem os homens depois, apenas por me terem olhado no estande com a saia justa e rija um pouco acima do joelho? Mas essa é a intimidade deles. A minha é aqui, onde espero que os vizinhos só me peçam uma xícara de açúcar ou uma cabeça de alho.
Mas, afinal, quanto eu cobro? Ganho presentes e dou presentes. Eu não me aproveito, nem me sinto aproveitada: quando homens pagam amorosamente por jantares, mesmo assim rejeito uma aproximação caso não me sinta conectada, e eles apenas vão embora. Nunca fui de representar cenas de novela, embora uma ou duas amigas pareçam se esforçar para criar situações assim.
Ao sair na manhã seguinte, apaisanada em roupas largas, cruzei com ele no saguão de entrada. Voltava da rua com um saquinho de pães, que carregava na mão da aliança. Com a mesma seriedade e despreocupação da véspera, saudou-me dizendo bom-dia. Retribuí automaticamente.
Comecei a entrevê-lo quase sempre — por coincidência, ou simplesmente por agora o reconhecer. Olhava meus olhos, com rapidez e respeito. A cada vez, um bom-dia mais afetuoso.
Só ficou... e não precisava ter ficado, mas ficou, uma tristeza. Acontece quando ganho de alguém um sorriso ou uma mesura. Acontece — e não é muito fácil confessar — quando recebo aquele flerte discreto, polido, até bonito, mas que ao mesmo tempo, no fundo, como se sibilasse, parece sempre me sussurrar “e o programa, querida? Quanto é?”.
Naquela noite, mesmo com essa pressa, segurei a porta para um homem do quinto, em quem nunca tinha prestado atenção.
Ele não me agradeceu, ou despercebi. Encarou depressa, mas perceptivelmente, o decote que eu não havia tido tempo de trocar na saída do evento.
Cada um apertou um botão. Foi então que ele disse:
— Quanto é o programa, querida?
Não sei de que modo externei o sufoco em meu coração ao ouvir essas palavras. Posso ter gemido, ou suspirado. Ele não me amedrontava. A pergunta teve até leveza, descuido. Não consegui dizer nada, ou não quis. Farejei por bafo de álcool, mas o resultado foi inconclusivo. Saí no meu andar sem lhe voltar o rosto.
Já recebi propostas em eventos, mas sempre soaram diferente para mim. A pessoa é comedida, muitas vezes não avançando além da sugestão indireta. Isso me permite negar com educação e pelo menos fingir que não sofri nenhum embaraço. Se um desconhecido me convida para jantar, o que parece até honrado, recuso para não estimular confusões.
No elevador, porém, foi um assalto. O prédio é meu lar, meu aconchego. No trabalho posso estar vendendo minha beleza e juventude para uma marca. Certamente excito. O que fazem os homens depois, apenas por me terem olhado no estande com a saia justa e rija um pouco acima do joelho? Mas essa é a intimidade deles. A minha é aqui, onde espero que os vizinhos só me peçam uma xícara de açúcar ou uma cabeça de alho.
Mas, afinal, quanto eu cobro? Ganho presentes e dou presentes. Eu não me aproveito, nem me sinto aproveitada: quando homens pagam amorosamente por jantares, mesmo assim rejeito uma aproximação caso não me sinta conectada, e eles apenas vão embora. Nunca fui de representar cenas de novela, embora uma ou duas amigas pareçam se esforçar para criar situações assim.
Ao sair na manhã seguinte, apaisanada em roupas largas, cruzei com ele no saguão de entrada. Voltava da rua com um saquinho de pães, que carregava na mão da aliança. Com a mesma seriedade e despreocupação da véspera, saudou-me dizendo bom-dia. Retribuí automaticamente.
Comecei a entrevê-lo quase sempre — por coincidência, ou simplesmente por agora o reconhecer. Olhava meus olhos, com rapidez e respeito. A cada vez, um bom-dia mais afetuoso.
Só ficou... e não precisava ter ficado, mas ficou, uma tristeza. Acontece quando ganho de alguém um sorriso ou uma mesura. Acontece — e não é muito fácil confessar — quando recebo aquele flerte discreto, polido, até bonito, mas que ao mesmo tempo, no fundo, como se sibilasse, parece sempre me sussurrar “e o programa, querida? Quanto é?”.
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